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AMMP recorda: José Campomizzi Filho

Quantos propósitos cabem em uma vida? Jornalista, militar, advogado, professor e Procurador de Justiça. Praticamente tudo foi possível para José Campomizzi Filho. Os feitos foram maiores que sua própria vida. Hoje, o edifício da Procuradoria-Geral de Justiça, uma escola em Ubá e uma rua de Belo Horizonte ostentam seu nome.

Nascido em 1923, em Ubá, na Zona da Mata mineira, filho de José e Erotides, José Campomizzi Filho demonstrou, desde tenra idade, habilidade com as palavras. Ainda na escola começou a escrever poesias e peças para que seus irmãos encenassem.

Adolescente, após 2 anos e meio, desistiu do seminário de Mariana e voltou para Ubá para estudar. Nascia então o articulador político e o brilhante orador, predicados que o permitiram alcançar a presidência do grêmio estudantil.

Mesmo muito jovem, tornou-se jornalista e começou a escrever para a Folha do Povo e para o Cidadão de Ubá. Das palavras passou para as armas, já que entrou para o 182º Tiro de Guerra. Em 1944, quase embarcou para a Itália, onde lutaria na 2º Guerra Mundial. Não foi preciso, o conflito foi encerrado. Deixou as Forças Armadas como sargento.

Posteriormente, ingressou na faculdade de Direito do Rio de Janeiro. Como as aulas eram aos finais de semana, durante a semana retornava à Ubá para ajudar seu pai no Comércio & Companhia. Eram muitos afazeres, mas José Campomizzi sempre encontrava tempo para mais atividades. Na mesma época, dava aulas na escola estadual e escola do Comércio e tornou-se redator da Folha do Povo. Em 1950, formou-se em Direito, o que não foi o bastante. Também se bacharelou em história e geografia pela Faculdade de Filosofia e Letras de Juiz de Fora.

Ainda na década de 50, passou a advogar, mesmo para os clientes que não podiam pagar. Era comum receber em porcos, galinhas e outros alimentos. No mesmo período, continuou exercendo a profissão de jornalista. Colaborava com o Estado de Minas, Diário de Minas, Folha de Minas, o Debate e Gazeta Mercantil.

Em 1956, sabe-se lá como, assumiu mais uma grande responsabilidade e iniciou sua trajetória no Ministério Público, quando foi nomeado para a comarca de Tupaciguara. No ano seguinte, foi removido para Senador Firmino.

No Ministério Público sua carreira continuou em progressão. Em 1966 foi promovido, por merecimento, para comarca de Itabira. O próximo passo foi o retorno à sua cidade natal para atuar na 3ª entrância.
Mesmo durante o período no MP, José Campomizzi continuou dedicando seu tempo à educação. Foi professor do Ginásio Participar “Nossa Senhora da Conceição” em Senador Firmino (1957 a 1967), tendo sido também diretor (1957 a 1959, 1965 a 1967).

Mais uma vez por merecimento, foi promovido para a 14ª Promotoria de Justiça de Belo Horizonte em 1977. Em 1978, foi escolhido para ser Procurador de Justiça e secretário adjunto da Secretaria de Estado da Educação.

As atividades no jornal Folha do Povo foram acompanhadas pela censura do regime militar brasileiro. De acordo com o documento redigido pelo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), os exemplares do periódico seriam analisados para verificar se havia algo comprometedor.

Mesmo aos 70 anos, teve fôlego para fundar a Academia Ubaense de Letras em julho de 1983. Seu último cargo no MP foi em 1984, quando exerceu a função de Diretor do Centro de Aperfeiçoamento Cultural e Profissional do Ministério Público.

Em setembro de 1987, em Belo Horizonte, deixou a vida para viver na memória de seus familiares, do MPMG e de cidadãos com quem conviveu em diversas cidades.

Há de se ressaltar que tal currículo foi construído em meio aos deveres familiares. Junto com a sua esposa Ica de Castro Arantes, cuidou de nove filhos: Jansen, Hélder, Clemen, Jader, Sigrid, James, Jeser, Herman e Jacson.

Assim como o pai, Jacson Rafael Campomizzi também escolheu a vida ministerial. O hoje Procurador de Justiça da Procuradoria de Justiça de Direitos Difusos e Coletivos contou em entrevista como foi conviver com o Dr. José.

Jacson Rafel Campomizzi Procurador de Justiça

1) O edifício da Procuradoria, uma escola em Ubá e uma rua de Belo Horizonte carregam o nome do seu pai. O que representa para você o legado deixado por ele?
Eu poderia me definir como um conjunto de memórias vivas, que vai dirigindo o presente e projetando o futuro. Meu pai ocupa um largo espaço nesse conjunto de imagens e afetos e certamente, mesmo que inconsciente, define meu proceder como membro do Ministério Público. A potência de sua vida deixou marcas nos meios sociais, profissionais e acadêmicos pelos quais passou, de forma que sua presença na família e em cada um de seus entes queridos é igualmente marcante. Tive a oportunidade de desde muito cedo acompanhá-lo em suas lides forenses, principalmente em Senador Firmino, Comarca em que atuou por 10 anos.
Éramos nove filhos. Para aliviar um pouco minha mãe, nos carregava para o trabalho. Já dormi no sofá do fórum de Senador. O café da manhã era um ovo quente feito numa chaleira elétrica.

2) Seu pai demonstrou grande capacidade de conciliar atividades diversas ao longo da vida. É possível apontar onde o Dr. José Campomizzi Filho mais se destacou?
O Promotor de Justiça era certamente a referência mais popular. A varanda de nossa casa em Ubá estava quase sempre repleta de cidadãos em busca de solução para seus problemas. A Procuradoria Geral de Justiça o designava para fazer as acusações no Tribunal do Júri em casos rumorosos em várias Comarcas – um Francisco Santiago de hoje. Os movimentos do Promotor levaram a criar escolas e instituições de amparo à criança e adolescente.

3) Como jornalista, poeta e fundador da Academia Ubaense de Letras, seu pai tinha grande afinidade com as palavras e chegou a se corresponder com Carlos Drummond de Andrade. O senhor se recorda das cartas?
Por mais de cinquenta anos exerceu a atividade jornalística editando jornais locais e escrevendo em periódicos de âmbito estadual e até nacional. Durante esse longo período, escreveu semanalmente uma crítica literária de livros que recebia de editoras, principalmente a Record. Alguns autores escreviam de volta, comentando ou agradecendo – tenho algumas dessas cartas.

4) É possível mensurar o real impacto do seu pai na história do MPMG?
A ditadura abafou grande parte de sua geração. Não que ele tivesse conflito exposto com o regime de exceção, mas tenho documento comprovando que suas atividades eram acompanhadas muito de perto pelo departamento político do regime. Mas sem dúvida foi a geração dele que nos entregou o Ministério Público constitucional de hoje.

5) Para ele, como o MPMG deveria atuar?
Outra época, mas como hoje se metia em tudo que é interesse da população, certamente mais mediando conflitos do que judicializando as questões – não havia a Lei da Ação Civil Pública e outros instrumentos de representação dos conflitos coletivos junto ao Judiciário.

6) Quais as suas recordações mais marcantes do seu pai?
Minha mente está povoada de memórias nesse instante que respondo. Não assisti, mas lembro-me do júri de três dias muitíssimo comentado, do réu que assassinou o juiz de Goianá e sua esposa, grávida na ocasião dos fatos (Goianá deixou de ser comarca), desaforado para Juiz de Fora. O povo comentava os debates entre ele e o advogado de defesa, Wandenkolk Moreira. Ganhou o Júri mas quase perdeu a voz.
Ao lado de outros colegas brilhantes, o orador não recusava um convite para homenagear, marcar fatos ou datas. Certa feita o colega designado para a homenagem, em cima da hora não pode comparecer. De imediato disseram: ‘chame o Campomizzi’…

Galeria José Campomizzi Filho

Carta de Carlos Drummond de Andrade

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